O Grande Samba dos Bastidores



Se você piscou, perdeu mais uma reviravolta. A política brasileira virou um samba de enredo confuso, sem harmonia nem letra clara — e com personagens que desafinam juntos, mas marcham em direções opostas. Na avenida principal do caos, desfilam Tarcísio de Freitas, Eduardo Bolsonaro, Jair Bolsonaro, Ciro Nogueira, Ciro Gomes, e até o sempre presente Donald Trump, agora de volta ao palco internacional querendo taxar o Brasil. Se meter na 25 de março e até no PIX. Tudo ao mesmo tempo agora. E ninguém se entende. Ou precisando se entender.


Tarcísio e a Direita Tonta

Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, tenta fazer um governo “de direita” sem parecer bolsonarista demais. Um equilibrismo complicado, porque foi eleito com a bênção direta do ex-presidente Jair Bolsonaro. No entanto, em um estranho movimento de autonomia (ou oportunismo político?), Tarcísio ensaia falas moderadas, aproximações institucionais com o STF e pautas mais técnicas, distantes do populismo raivoso que garantiu sua vitória.

A direita bolsonarista raiz não perdoa essa “traição”. Eduardo Bolsonaro, filho 03 e guardião do dogma, já alfinetou o governador mais de uma vez, sugerindo que Tarcísio está “se perdendo” ao tentar agradar “a esquerda”. O problema é que ninguém sabe exatamente o que significa “a esquerda” nesse discurso — pode ser desde o Centrão até um juiz que respeita a Constituição. A régua muda conforme o clima.

Enquanto isso, Tarcísio recua aqui, avança ali, sinaliza privatizações, entrega obras, faz discursos técnicos e finge que a base bolsonarista radical ainda o apoia. Mas o discurso “sou gestor, não político” vai soando cada vez mais vazio em meio ao tiroteio verbal do clã Bolsonaro.


Bolsonaro contra Ciro Nogueira (e contra todo mundo)

Do outro lado da ala conservadora, o ex-presidente Jair Bolsonaro parece viver em permanente estado de guerra, inclusive com seus próprios aliados. Após anos de casamento de conveniência com o Centrão — com direito a fotos sorridentes com Ciro Nogueira e Arthur Lira — Bolsonaro agora tenta reescrever essa relação como se nunca tivesse existido. Mas o cenário na Câmara e no Senado também mudou. Será?

Em entrevistas recentes, insinuou que o Centrão é “o sistema” e que o PP (Partido Progressistas), de Ciro Nogueira, não pode mais ser confiável. Ciro, por sua vez, responde como um general frio: sorri em silêncio e continua articulando, garantindo a sobrevivência do Centrão nos corredores do poder. Enquanto Bolsonaro esperneia, Ciro come pelas beiradas — e se prepara para influenciar o próximo governo, seja ele qual for.

Bolsonaro também não poupa seus ex-ministros. Um dia elogia, no outro insinua que “traíram o projeto”. Já não se sabe mais quem é aliado ou inimigo. Os fiéis de ontem viram traidores de amanhã, enquanto o próprio ex-presidente (assim pensa Eduardo)flutua entre Miami ou no Texas, a Justiça Eleitoral e uma militância cada vez mais perdida, sem saber se segue o mito (e nunca foi), o pastor ou o influencer de direita da semana. Agora Jair, o Messias, não ter o jogo no seu quadrado. Melhor dizendo no quadrado da sua casa com uma tornozeleira eletrônica. Eduardo, o numero 3, que se cuide.


Ciro Gomes e o Jantar Frio

E falando em comensais discretos, Ciro Gomes continua seu banquete solitário. Amargurado com o resultado das últimas eleições e sem espaço em um PDT rachado, tenta construir um discurso alternativo ao lulismo e ao bolsonarismo, mas já sem a força de antes.

Ainda assim, Ciro é inteligente o bastante para saber que as fagulhas internas da direita podem se tornar sua oportunidade. Sua retórica agressiva, recheada de adjetivos, agora se volta mais para a desilusão com “todos os lados”. Com frequência, é visto dando entrevistas com frases que agradam a todos e a ninguém: “o Brasil precisa de um novo projeto nacional”. Quem discordaria?

Se conseguir sair do isolamento e vencer seu próprio ego, pode virar uma peça importante nos tabuleiros secundários da política. Mas, por enquanto, continua comendo pelas beiradas, de olho na próxima crise.


Trump e o Alvo Sul-Americano

E como se não bastasse a confusão doméstica, o velho Trump está de volta. Disparando ameaças protecionistas como nos velhos tempos, o atual presidente dos Estados Unidos vem taxando fortemente produtos vindos do Brasil. Até a 25 de março, o cara está querendo se meter. Inimaginável.

Segundo Trump, o Brasil estaria “roubando empregos americanos”, ecoando seu discurso padrão de 2016, mas agora mirando setores como aço, alumínio e até o agronegócio — justamente o orgulho do bolsonarismo. Ironia das ironias, o ídolo político de Bolsonaro agora ameaça diretamente os exportadores brasileiros que o apoiaram com fervor durante quatro anos.

A resposta do governo brasileiro até aqui tem sido cautelosa. Lula e sua equipe adotam o tom diplomático, tentando evitar conflito aberto. Mas o recado é claro: se Trump avançar, o Brasil pode entrar novamente na mira das tarifas americanas. Isso complicaria ainda mais as costuras políticas e econômicas internas, num país que depende das exportações como nunca. Ninguém ganha no final das contas. Nem americanos e nem os brasileiros.


O Brasil no Meio do Redemoinho

A grande verdade é que, em meio a tanta confusão, a política brasileira parece sem norte. A direita não sabe mais o que é, nem quem lidera. Bolsonaro está inelegível, mas insiste em comandar. Tarcísio quer ser alternativa, mas teme romper com o bolsonarismo. Eduardo Bolsonaro virou um combatente digital que vê traidores por toda parte. E o Centrão? Continua fazendo o que sempre fez: aguardando o próximo governo para negociar cargos.

Do outro lado, a esquerda assiste de camarote — ou finge que assiste. Lula governa com uma base fisiológica, enquanto evita entrar na briga dos conservadores. Mas sabe que, em 2026, enfrentará um cenário muito mais pulverizado, com figuras à direita brigando entre si por um lugar ao sol.

Neste cenário de ruídos, traições e egos inflados, o eleitor médio vai ficando cada vez mais confuso. Quem é quem nesse jogo? Quem representa o quê? O bolsonarismo é uma corrente de ideias ou uma seita em torno de um homem? Tarcísio é a “nova direita”? O Centrão virou partido? E por que Trump ainda interfere aqui?

Talvez a resposta esteja em aceitar que a política brasileira vive um momento de transição e desordem. E, como todo processo caótico, isso pode dar em algo novo — ou apenas repetir os mesmos erros com novos rostos. Até lá, seguimos assistindo esse teatro torto, onde os atores brigam no camarim e a plateia, cada vez mais cética, já nem bate palma.



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