Turismo Verde, Ancestralidade e Territorialidade: O Futuro é Ancestral
Em um tempo em que os impactos da modernidade colocam em risco a integridade dos ecossistemas e das culturas tradicionais, o turismo verde emerge como uma possibilidade de reconexão: com a terra, com os saberes ancestrais e com a própria ideia de pertencimento. Não se trata apenas de viajar de maneira sustentável, mas de viajar com respeito, escuta e envolvimento.
O filósofo Airton Keinak afirma que "o futuro é ancestral" — uma frase que, à primeira vista, parece um paradoxo. Mas, ao mergulhar em sua densidade, compreendemos que é justamente no resgate dos modos de vida tradicionais, nas práticas de convivência com a natureza e no reconhecimento das cosmologias originárias que se desenha uma nova visão de mundo. Uma visão que, paradoxalmente, é muito antiga.
O turismo verde — também chamado de ecoturismo ou turismo ecológico — é uma prática que busca minimizar os impactos ambientais das atividades turísticas e maximizar os benefícios para as comunidades locais. Porém, essa definição técnica não dá conta de todo o seu potencial transformador. Quando aliado à valorização da ancestralidade e da territorialidade, o turismo verde se transforma em uma ferramenta de educação, regeneração e justiça histórica.
Ancestralidade como bússola
Para muitos povos tradicionais, o tempo não é uma linha reta, mas um círculo. O passado vive no presente, e os ancestrais continuam presentes, orientando os caminhos dos vivos. Ao visitar comunidades que preservam esses saberes, o turista atento é convidado a rever suas próprias noções de tempo, progresso e identidade.
Ancestralidade, nesse contexto, não é sinônimo de passado congelado, mas de um saber vivo que se reinventa sem romper com suas raízes. É nesse sentido que o futuro pode — e talvez precise — ser ancestral. Na Sabiaguaba, região localizada na cidade de Fortaleza, uma das primeiras praias do litoral leste do Ceará, é um bom exemplo de como o passado vive e convive com o presente. A antiga vila de pescadores se abre para pensar o presente e buscar inovações mas respeitando suas tradições e seu modo de vida. Assim Território, para a comunidade da Sabiaguaba, é muito mais do que terra. É um espaço de memória, espiritualidade e identidade coletiva.
Pois o turismo verde, quando articulado com a valorização da territorialidade, deve respeitar esse vínculo profundo entre as pessoas e os lugares. Isso implica não apenas evitar impactos negativos, mas também reconhecer a autonomia das comunidades, como acontece na Sabiaguaba, na gestão de seus territórios e narrativas. Deste modo, não há turismo sustentável sem justiça territorial.
Cultura viva e preservação
Cada visita a comunidade da Sabiaguaba é também um encontro com uma cultura viva. Mitos, músicas, danças, modos de plantio, rezas, festas e formas de organização social compõem um patrimônio imaterial de valor incalculável. Mas a presença do turismo, se não mediada com cuidado e respeito, pode transformar o que é vivo em produto, o que é sagrado em espetáculo. Pensando disso, o Governo do Estado do Ceará construiu o Complexo Ambiental e Gastronômico da Sabiaguaba, em 2022, que abriga 16 quiosques servindo a culinária local e um Centro de Memoria Raízes da Sabiaguaba que narra a história do lugar.
O futuro é ancestral
A afirmação de Airton Keinak nos obriga a repensar não apenas o turismo, mas a própria ideia de futuro. E se, em vez de projetarmos utopias tecnológicas e alienadas da terra, voltássemos nossos olhos para os conhecimentos milenares que sempre souberam viver em harmonia com o planeta? E se o verdadeiro progresso fosse reconectar-se ao que fomos, para imaginar outros modos de ser?
O turismo verde, ancorado na ancestralidade e no respeito às territorialidades, aponta nessa direção. Uma direção que não é nova, mas que — talvez por isso mesmo — seja revolucionária. O que importa é unir cultura, turismo e meio ambiente numa só palavra respeito, consciência e desenvolvimento sustentável.
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